Imprensa

2.10.19

Filippo Argenti: o acerto final

Filippo Argenti: la resa dei conti.

Mentre noi corravam la morta gora,
dinnanzi mi si fece un pien di fango, e disse: ‘Chi se’ tu che vieni anzi ora?’ (Inf., VIII, 31-33)

Íamos nós no barco sujo embora,
e alguém banhado em lama identifico
que diz: “Quem és, chegado antes da hora?”.
(tradução de Jorge Wanderlei)

A pergunta do espírito que surge das águas lamacentas aonde os coléricos cumprem sua pena é deliberadamente provocadora, de acordo com o caráter que o mesmo tinha antes de chegar ali, como para dizer: porque você vem pro inferno antes da hora, já que de qualquer forma vai acabar aqui? La domanda dello spirito, che emerge dalle acque fangose ove gli iracondi scontano la loro colpa, è volutamente provocatoria, conformemente al suo precedente stile di vita, come a dire: perché vieni all’inferno prima del tempo, dove dovrai comunque finirci?

Imediata e lapidária e replica de Dante: 'Só passo mas não fico'. E finge não reconhece-lo: 'e tu quem és, que tanto te sujaste?' Dante quer envergonha-lo, obrigando-o a declarar sua identidade. A alma tenta eludir a pergunta e provocar compaixão: sou um dos muitos que cumprem a pena... Mas Dante não cai no papo e insiste:
Immediata ed epigrammatica la replica di Dante: ‘S’i’ vengo non rimango’. E finge di non riconoscerlo: ‘Ma tu chi se’, che sì se’ fatto brutto?’ Vuole infatti svergognarlo, facendogli dichiarare la sua identità. L’anima cerca di evitare la risposta impietosendolo: sono uno dei tanti che espiano … Dante non ci casca, e rincara la dose.

E io a lui: “Con piangere e con lutto,

spirito maledetto, ti rimani;
ch’io ti conosco, ancor sie lordo tutto”. (Inf., VIII, 37-39)

E eu: “Pois que o pranto e a dor que a ti chamaste,
maldito espírito, fiquem contigo;
não te esconde o com que te enlameaste”.
(tradução de Jorge Wanderlei)

Dante conhecia bem Filippo Argenti, assim chamado pelo gosto de ferrar seu cavalo com ferradura de prata (em italiano argento=prata). Contemporâneo do poeta e filho de uma das famílias mais ricas e poderosas de Florença, todos guelfos da facção preta (contrária, portanto à de Dante, partidário da facção branca), Filippo era também vizinho dos Alighieri. Os contemporâneos descrevem-no como uma pessoa desagradável, arrogante, colérica e sem nenhuma virtude. Era mais do que suficiente para despertar em Dante um sentimento de antipatia e desprezo, pelas substanciais diferencias de caráter e ética.
Dante doveva conoscere bene Filippo Adimari, soprannominato ‘Argenti’ per il vezzo di ferrare il suo cavallo con ferri d’argento. Suo contemporaneo e rampollo di una delle famiglie più ricche e potenti della città, tutta gente guelfa di parte nera (la parte avversaria di Dante, che era di parte bianca), Filippo era anche vicino di casa degli Alighieri. I contemporanei lo descrivono come persona assolutamente spiacevole, piena di boriosa arroganza, incline all’ira e privo di qualunque pregio e virtù. Ce n’era più che a sufficienza per suscitare in Dante un totale sentimento di antipatia e disprezzo, per totale divergenza caratteriale ed etica.

Como se isso não bastasse, após a morte de Filippo (em 1300, de fato já está colocado por Dante no Inferno), os Adimari opuseram-se firmemente à volta do poeta na cidade, e um irmão de Filippo conseguiu obter os bens que tinham-lhe sido confiscados. Dante complementa seu juízo negativo sobre os Adimari por meio de seu tataravô Cacciaguida, que os descreve como vis, intrigantes e corruptos (Par, XVI, 115 2 seg.).
Come se ciò non bastasse, dopo la morte di Filippo (nel 1300, infatti, è già collocato da Dante all’inferno), gli Adimari si opposero fortemente al rientro del poeta in città, ed un fratello di Filippo riuscì ad incamerarne i beni confiscati. Dante completa il negativo giudizio sugli Adimari, per bocca del suo trisavolo Cacciaguida, che li definisce vili, intriganti e corrotti (Par, XVI, 115 2 seg.)

Estes acontecimentos ajudam a entender, pelo menos em parte, o extremo desgosto, que chega até a crueldade,com o qual Dante encerra o encontro com Filippo Argenti, caso único em todo o poema. Virgílio, de fato, não apenas repele a tentativa do condenado de subir no barco para atacar o adversário, empurrando-o de volta e gritando: 'vai-te com os outros cães', mas abençoa o poeta pelo justo desdém, beijando-o e abraçando-o. Na sequência, junta-se a Dante no desejo de ver Filippo mergulhar na lama antes do fim da travessia, para que possa gozar do espetáculo oferecido pela agressão que lhe infligem os outros condenados. Questi avvenimenti aiutano a capire, almeno in parte, l’estremo disprezzo, sconfinante nella crudeltà, con cui Dante conclude l’incontro con Filippo Argenti, caso unico in tutto il poema. Il sollecito Virgilio, infatti, non solo respinge il tentativo del dannato di issarsi sulla barca per scagliarsi contro l’avversario, ricacciandolo giù e gridandogli : ‘Via costà con gli altri cani!’, ma arriva a benedire il poeta per il suo giusto sdegno, baciandolo ed abbracciandolo. E subito dopo asseconda il desiderio di Dante, di vederlo rituffare nel fango prima che termini il tragitto in barca, perché possa godersi lo spettacolo dello strazio che di lui fanno gli altri dannati.

“Tutti gridavano: ‘A Filippo Argenti!’,

e ‘l fiorentino, spirito bizzarro (iracondo)
in se medesmo si volvea coi denti.” (Inf. VIII, 61-63).

"Filippo Argenti! É ele" iam dizendo,
e o florentino espírito tão rude
ia a si mesmo em carne se mordendo.
(Jorge Wanderlei)

Da para pensar que, além de qualquer consideração sobre a justa pena (estabelecida inclusive por desejo divino!...) para esta ordem de condenados, genericamente chamados de 'cães', neste caso Dante quis tirar uma satisfação pessoal, num acerto final com caráter de vingança, mesmo que puramente verbal e no campo da pura imaginação. Quando escrevia estes versos, os acontecimentos políticos que tinham envolvido o poeta de forma tão injusta, perturbando sua existência, eram ainda muito próximos e deviam queimar no limite da suportação. Viene da pensare che, oltre ogni considerazione sulla giusta punizione (fra l’altro voluta da Dio! …), che spetta a questa categoria di dannati, globalmente chiamati ‘cani’, in questo caso Dante abbia voluto prendersi una sorta di soddisfazione personale, in una resa dei conti che assume i caratteri di una vendetta, anche se solamente verbale e nel campo della pura immaginazione. Quando scriveva questi versi, gli avvenimenti politici che lo avevano coinvolto così ingiustamente, sconvolgendone l’esistenza, erano ancora molto vicini nel tempo e dovevano bruciare ai limiti del sopportabile.

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